Em parecer, Paulo Gonet defendeu ajustes no tempo de armazenamento das imagens. PGR entende que portaria da Justiça não prevê necessidade de gravações sempre ininterruptas
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu que o Supremo Tribunal Federal (STF) determine que governo de São Paulo altere o edital sobre a compra de câmeras corporais para a Polícia Militar, lançado no mês passado pela gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Em parecer enviado ao Supremo, a PGR avalia que o estado de SP deve ajustar a exigência de tempo de armazenamento das imagens levando em consideração os prazos mínimos estabelecidos em portaria do Ministério da Justiça.
O texto indica prazo mínimo de noventa dias, como regra, e de um ano para gravações intencionais.
Para Gonet, a portaria do Ministério da Justiça não prevê, portanto, a necessidade de que as gravações sejam sempre feitas de forma ininterrupta.
“O parágrafo 2º do dispositivo afirma preferencial a adoção da modalidade acionamento automático. Não a torna, assim, impositiva para os Estados, Distrito Federal e Municípios”, diz o texto.
O parecer da PGR responde a recurso da Defensoria Pública de São Paulo, e de outras organizações da sociedade civil ligadas à segurança pública, que acionaram o STF para solicitar revisão do novo edital de contratação de 12 mil câmeras da PMSP, lançado em maio.
Segundo as novas regras, a gravação de vídeos pelo equipamento deverá ser realizada de forma intencional, ou seja, o policial será responsável por gravar ou não uma ocorrência. A captura de imagens também não será mais ininterrupta como ocorre atualmente. No recurso ao STF, a Defensoria pediu que o edital seja refeito.
Na petição, os defensores públicos do núcleo especializado de cidadania e direitos humanos reforçam a preocupação com as mudanças e alertam para o risco de precarização do programa (entenda mais abaixo).
Críticas ao edital
Entidades da sociedade civil ligadas à segurança pública manifestaram preocupação com o novo edital e alertam para o risco de precarização do Programa Olho Vivo.
As organizações afirmam que o sucesso do programa corre risco em razão das mudanças no armazenamento de imagens, tipo de gravação e comprovação da capacidade de fornecimento de equipamentos pelas empresas que desejam participar da licitação.
As entidades apontam que a gravação de todo o turno de trabalho dos PMs pelas câmeras corporais tem garantido a redução da letalidade policial e do uso da força de forma indiscriminada e sem controle durante abordagens. O equipamento também oferece proteção jurídica e física aos próprios policiais.
Requisitos para participação da licitação não estão claros
Na avaliação das organizações, os requisitos para habilitação técnica das empresas que desejarem participarem da licitação das câmeras corporais, especialmente quando comparado com os editais de 2020 e 2021, não estão claros.
O edital exige que, para participar do certame, as empresas devem comprovar a capacidade de fornecimento de apenas 500 “câmeras de vídeo”, o equivalente a 4% do total de equipamentos a serem contratados.
Entretanto, em 2020, exigiu-se das empresas concorrentes a comprovação de capacidade técnica de fornecimento de, no mínimo, 50% do objeto licitado.
Encontro com Barroso
Mais cedo, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, recebeu o governador Tarcísio de Freitas e procuradora-geral do estado de São Paulo, Inês Maria dos Santos Coimbra.
Durante o encontro nesta terça-feira (4) o governador e a procuradora apresentaram ao ministro as razões que justificam as opções do edital de aquisição das câmeras para instalação nos uniformes do PMs.
Também nesta terça, uma equipe do Núcleo de Processos Estruturais Complexos (Nupec) do STF esteve com o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, para examinar in loco a situação das câmeras em São Paulo. Segundo a Corte, a viagem estava marcada antes da publicação do edital da aquisição dos dispositivos pelo estado.
Mudanças no sistema das câmeras
Atualmente, há 10.125 câmeras em operação no estado que foram compradas por meio de dois contratos, e as gravações são divididas em duas categorias: de rotina e intencionais. Todas elas serão substituídas pelos novos equipamentos e 2 mil novas serão compradas.
Os vídeos de rotina registram todo o turno do policial e são obtidos sem o acionamento, portanto gravam de forma ininterrupta. Atualmente, os PMs não têm autonomia para escolher o que desejam registrar. Tudo é gravado, ao menos em vídeo. O que eles podem fazer é acionar para ativar o som e melhorar a qualidade da imagem.
Já os vídeos intencionais são obtidos pelo acionamento proposital do policial e ficam guardados por um ano. Elas também possuem som ambiente e resolução superior às gravações de rotina.
No novo edital, não há menção às gravações rotineiras, somente às intencionais. O documento também informa que o acionamento para captura de imagens poderá ser feito de forma remota pelo Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) ou pelo próprio policial. Além disso, os vídeos serão transmitidos ao vivo (live streaming) pela internet para a central da corporação.